Intercâmbio problematiza a geração de energia eólica e solar no Submédio São Francisco
O interesse e a necessidade em conhecer de perto as vantagens e prejuízos existentes na geração de energia eólica e solar na região do Submédio São Francisco, motivou a Articulação Popular São Francisco Vivo a promover, nos dias 19 e 20 de agosto, um Intercâmbio nos municípios de Sento Sé e Juazeiro, no norte da Bahia.
Participaram da atividade representantes do Irpaa, Comissão Pastoral da Terra - CPT, de comunidades tradicionais Fundo de Pasto e estudantes que no primeiro dia visitaram experiências de geração de energia eólica e energia solar, com o objetivo de conhecer os dois modelos de implantação e identificar os principais impactos positivos e negativos, sobretudo no modo de vida local.
A primeira experiência foi vista na comunidade de São Pedro, no interior de Sento Sé, que há dois anos possui um parque de energia eólica, a energia gerada a partir dos ventos. O parque é de responsabilidade de empresas privadas ligadas ao grupo Brenan e da Chesf – Companhia Hidroelétrica do São Francisco – e atualmente 104 aerogeradores estão funcionando, com previsão de instalação total de aproximadamente 500, todos localizados em serras ou áreas altas e planas. O grupo pode ouvir de representantes da própria comunidade o que consideram benefícios trazidos com a implantação do parque e quais os prejuízos que afetam tanto as/os proprietários/as de terras onde estão instaladas as torres quanto as/os demais moradores/as da comunidade.
Em seguida, o grupo conheceu um projeto piloto no Brasil, que é a geração de energia solar a partir de painéis instalados nos telhados das unidades habitacionais de dois Residenciais do Programa “Minha Casa, Minha Vida”, do governo federal. A partir de modelo construído pela empresa Brasil Solair, 2,1 megawatts-hora (MWh) de energia é gerada e vai para o Sistema Nacional de Energia, não sendo esta diretamente consumida nas mais de mil casas dos residenciais Morada do Salitre e Praia do Rodeadouro.
Opinião da população
Tanto na comunidade de São Pedro quanto nos residenciais do “Minha Casa, Minha Vida”, as opiniões se dividem quanto aos benefícios e problemas gerados com estas formas de geração de energias renováveis. O viés econômico acaba sendo o principal parâmetro para se avaliar a viabilidade dos modelos adotados, contudo, os impactos ambientais e sociais também foram observados pelos/as participantes do Intercâmbio.
Hoje, as principais críticas elencadas pelos/as moradores/as de São Pedro e dos residenciais referem-se a falta de transparência no processo de repasse dos lucros obtidos com a geração de energia, uma vez que nos dois casos, a/o proprietário/a da terra onde estão instaladas as torres eólicas ou da residência que hospeda o painel solar recebe um valor mensal. A insatisfação principal é devido ao desconhecimento dos valores exatos referentes a quanto é gerado de energia em cada propriedade e também quanto é pago às empresas por essa energia gerada e vendida para o sistema nacional.
De acordo com Gilsa Martins, síndica do residencial Morada do Salitre, “o problema maior nosso é a questão da venda da energia porque não passa pela nossa gestão. (…) A gente gostaria de está inserido nesse processo de venda porque aí a gente saberia realmente como funciona isso”. Além disso, alguns compromissos assumidos pelas empresas, segundo as/os moradores, não são cumpridas. Isso é mais presente na comunidade de São Pedro, que, conforme, afirmaram as famílias que participaram do Intercâmbio, alguns benefícios como posto de saúde, telefonia, serviços comunitários e garantia de estradas de boa qualidade não estão sendo efetivados. O morador da comunidade, José Ribeiro, informa que a recuperação da estrada foi uma das expectativas da comunidade, porém esse benefício só aconteceu provisoriamente enquanto a empresa estava dedicada a instalação do parque.
As vantagens, nas duas experiências visitadas, não contemplam por completo as comunidades e ainda acabam contribuindo para a geração de conflitos internos. O valor repassado mensalmente para as famílias ainda são considerados injustos nas duas realidades. “A gente fica à toa, não tem certeza se recebe o valor justo, queria que a gente fosse mais informado um pouco sobre isso”, reclama Adriana Custódio, moradora e proprietária de área em São Pedro.
A partir das discussões, outras percepções preocuparam as/os participantes. Uma delas foi com relação aos contratos assinados com as empresas, que, segundo assessores da Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais da Bahia – AATR, alguns possuem cláusulas abusivas e que colocam as famílias praticamente numa situação de subserviência às empresas.
Viabilidade
A Articulação Popular São Francisco Vivo compreende que é necessário pensar formas alternativas de geração de energia, visto que a demanda de consumo é crescente e o modelo atual de matriz energética brasileira ainda é baseado em fontes que geram inúmeros impactos ao meio ambiente e a população, a exemplo das hidrelétricas e usinas nucleares.
Durante o Intercâmbio, ficou evidente a importância de optar por estas fontes de energia que aproveitam o potencial do sol e do vento, porém, é necessário observar a finalidade destes investimentos, especialmente quem está ganhando com isso, como reforça André Rocha, colaborador do Irpaa: “A forma como as empresas fazem a exploração parece sem nenhuma responsabilidade, nem com o meio ambiente, nem com a população local”. Para André, o problema maior está no modelo adotado, por isso “nós precisamos nos posicionar e defender uma proposta, precisamos ainda continuar estudando”, ressalta André, especialmente porque se trata de estruturas e linguagens difícies para quem não possui conhecimento específico na área e isso contribui para que a população possa vir até mesmo a ser lesada.
Para Gilsa Martins, o ideal é que houvesse a compensação da energia, o que poderia isentar as/os moradores/as da tarifa paga atualmente a Coelba (Companhia de Eletricidade da Bahia) ou do valor pago à Caixa Econômica Federal como prestação das moradias. A energia gerada seria consumida nas próprias residências, uma vez que, de acordo com informações da Brasil Solair, a quantidade de MWh hoje gerados é “o suficiente para abastecer 3,6 mil domicílios em um ano”.
Além da energia solar, micro aerogeradores instalados nas áreas centrais dos residenciais hoje também geram entre 2 e 5 KW de energia eólica, o que pode suprir a necessidade de uma residência que hoje paga cerca de R$ 70 pela eletricidade convencional consumida durante um mês.
Devido ao potencial eólico e solar na região, a aposta nestas alternativas, portanto, é viável. No entanto, a reivindicação das organizações sociais que defendem a Convivência com o Semiárido, a exemplo do Irpaa, é que sejam garantidos os direitos das comunidades, a justiça na divisão dos benefícios financeiros e que a preservação ambiental seja também uma das principais preocupações. Outra necessidade é o debate acerca de todos os tipos de fontes energéticas consideradas renováveis e sua relação custo-benefíco, além da importância de voltar-se para o estudo de modelos mais apropriados, a exemplo de alguns países como Áustria e Alemanha que já desenvolvem tecnologias mais populares e que beneficiam diretamente as famílias produtoras de energias e não as empresas.
No segundo dia do evento, além dos/das participantes das visitas, representantes de São Pedro e dos residenciais de Juazeiro, estiveram reunidos/as na sede do Irpaa para discutir as duas experiências, considerando os aspectos positivos e negativos. A partir disso, esses/as representantes irão levar a discussão para suas comunidades com vistas a encaminhar o que pode ser feito no sentido de aprimorar os atuais modelos de geração de energia que vem se expandindo na região.
Comunicação IRPAA
Participaram da atividade representantes do Irpaa, Comissão Pastoral da Terra - CPT, de comunidades tradicionais Fundo de Pasto e estudantes que no primeiro dia visitaram experiências de geração de energia eólica e energia solar, com o objetivo de conhecer os dois modelos de implantação e identificar os principais impactos positivos e negativos, sobretudo no modo de vida local.
A primeira experiência foi vista na comunidade de São Pedro, no interior de Sento Sé, que há dois anos possui um parque de energia eólica, a energia gerada a partir dos ventos. O parque é de responsabilidade de empresas privadas ligadas ao grupo Brenan e da Chesf – Companhia Hidroelétrica do São Francisco – e atualmente 104 aerogeradores estão funcionando, com previsão de instalação total de aproximadamente 500, todos localizados em serras ou áreas altas e planas. O grupo pode ouvir de representantes da própria comunidade o que consideram benefícios trazidos com a implantação do parque e quais os prejuízos que afetam tanto as/os proprietários/as de terras onde estão instaladas as torres quanto as/os demais moradores/as da comunidade.
Em seguida, o grupo conheceu um projeto piloto no Brasil, que é a geração de energia solar a partir de painéis instalados nos telhados das unidades habitacionais de dois Residenciais do Programa “Minha Casa, Minha Vida”, do governo federal. A partir de modelo construído pela empresa Brasil Solair, 2,1 megawatts-hora (MWh) de energia é gerada e vai para o Sistema Nacional de Energia, não sendo esta diretamente consumida nas mais de mil casas dos residenciais Morada do Salitre e Praia do Rodeadouro.
Opinião da população
Tanto na comunidade de São Pedro quanto nos residenciais do “Minha Casa, Minha Vida”, as opiniões se dividem quanto aos benefícios e problemas gerados com estas formas de geração de energias renováveis. O viés econômico acaba sendo o principal parâmetro para se avaliar a viabilidade dos modelos adotados, contudo, os impactos ambientais e sociais também foram observados pelos/as participantes do Intercâmbio.
Hoje, as principais críticas elencadas pelos/as moradores/as de São Pedro e dos residenciais referem-se a falta de transparência no processo de repasse dos lucros obtidos com a geração de energia, uma vez que nos dois casos, a/o proprietário/a da terra onde estão instaladas as torres eólicas ou da residência que hospeda o painel solar recebe um valor mensal. A insatisfação principal é devido ao desconhecimento dos valores exatos referentes a quanto é gerado de energia em cada propriedade e também quanto é pago às empresas por essa energia gerada e vendida para o sistema nacional.
De acordo com Gilsa Martins, síndica do residencial Morada do Salitre, “o problema maior nosso é a questão da venda da energia porque não passa pela nossa gestão. (…) A gente gostaria de está inserido nesse processo de venda porque aí a gente saberia realmente como funciona isso”. Além disso, alguns compromissos assumidos pelas empresas, segundo as/os moradores, não são cumpridas. Isso é mais presente na comunidade de São Pedro, que, conforme, afirmaram as famílias que participaram do Intercâmbio, alguns benefícios como posto de saúde, telefonia, serviços comunitários e garantia de estradas de boa qualidade não estão sendo efetivados. O morador da comunidade, José Ribeiro, informa que a recuperação da estrada foi uma das expectativas da comunidade, porém esse benefício só aconteceu provisoriamente enquanto a empresa estava dedicada a instalação do parque.
As vantagens, nas duas experiências visitadas, não contemplam por completo as comunidades e ainda acabam contribuindo para a geração de conflitos internos. O valor repassado mensalmente para as famílias ainda são considerados injustos nas duas realidades. “A gente fica à toa, não tem certeza se recebe o valor justo, queria que a gente fosse mais informado um pouco sobre isso”, reclama Adriana Custódio, moradora e proprietária de área em São Pedro.
A partir das discussões, outras percepções preocuparam as/os participantes. Uma delas foi com relação aos contratos assinados com as empresas, que, segundo assessores da Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais da Bahia – AATR, alguns possuem cláusulas abusivas e que colocam as famílias praticamente numa situação de subserviência às empresas.
Viabilidade
A Articulação Popular São Francisco Vivo compreende que é necessário pensar formas alternativas de geração de energia, visto que a demanda de consumo é crescente e o modelo atual de matriz energética brasileira ainda é baseado em fontes que geram inúmeros impactos ao meio ambiente e a população, a exemplo das hidrelétricas e usinas nucleares.
Durante o Intercâmbio, ficou evidente a importância de optar por estas fontes de energia que aproveitam o potencial do sol e do vento, porém, é necessário observar a finalidade destes investimentos, especialmente quem está ganhando com isso, como reforça André Rocha, colaborador do Irpaa: “A forma como as empresas fazem a exploração parece sem nenhuma responsabilidade, nem com o meio ambiente, nem com a população local”. Para André, o problema maior está no modelo adotado, por isso “nós precisamos nos posicionar e defender uma proposta, precisamos ainda continuar estudando”, ressalta André, especialmente porque se trata de estruturas e linguagens difícies para quem não possui conhecimento específico na área e isso contribui para que a população possa vir até mesmo a ser lesada.
Para Gilsa Martins, o ideal é que houvesse a compensação da energia, o que poderia isentar as/os moradores/as da tarifa paga atualmente a Coelba (Companhia de Eletricidade da Bahia) ou do valor pago à Caixa Econômica Federal como prestação das moradias. A energia gerada seria consumida nas próprias residências, uma vez que, de acordo com informações da Brasil Solair, a quantidade de MWh hoje gerados é “o suficiente para abastecer 3,6 mil domicílios em um ano”.
Além da energia solar, micro aerogeradores instalados nas áreas centrais dos residenciais hoje também geram entre 2 e 5 KW de energia eólica, o que pode suprir a necessidade de uma residência que hoje paga cerca de R$ 70 pela eletricidade convencional consumida durante um mês.
Devido ao potencial eólico e solar na região, a aposta nestas alternativas, portanto, é viável. No entanto, a reivindicação das organizações sociais que defendem a Convivência com o Semiárido, a exemplo do Irpaa, é que sejam garantidos os direitos das comunidades, a justiça na divisão dos benefícios financeiros e que a preservação ambiental seja também uma das principais preocupações. Outra necessidade é o debate acerca de todos os tipos de fontes energéticas consideradas renováveis e sua relação custo-benefíco, além da importância de voltar-se para o estudo de modelos mais apropriados, a exemplo de alguns países como Áustria e Alemanha que já desenvolvem tecnologias mais populares e que beneficiam diretamente as famílias produtoras de energias e não as empresas.
No segundo dia do evento, além dos/das participantes das visitas, representantes de São Pedro e dos residenciais de Juazeiro, estiveram reunidos/as na sede do Irpaa para discutir as duas experiências, considerando os aspectos positivos e negativos. A partir disso, esses/as representantes irão levar a discussão para suas comunidades com vistas a encaminhar o que pode ser feito no sentido de aprimorar os atuais modelos de geração de energia que vem se expandindo na região.
Comunicação IRPAA
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