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Jaguarary e suas Árvores‏

O VELHO TAMBORI: A MORTE DO MONGE VERDE DE JAGUARARY
Sinto saudade de Jaguarary como uma criança. Ainda, nas minhas lembranças, o Monte Santo é um gigante, o Bendó é uma terra longe e os pés de manga e jaca das Grotas são senhoras incólumes, monumentais. No antigo jardim, a bela fonte de formato arredondado, coberta de azulejos azuis, que dava um tom turquesa às águas jorrantes, era como um oceano, e mesmo o Vaqueiro, daquele painel de azulejo em frente à prefeitura, tomava-me de uma beleza única. Sentia-me mais sertanejo quando o observava.
Ao olhá-lo, via um guerreiro de vestes e armaduras de couro a correr sobre o destino e enlaçar as novilhas fugitivas, o boi de careta, do qual tive tanto medo. Lembrava-me as touradas espanholas. Essa praça, generosamente cuidada pelas mãos de um Jardineiro, era morada de antigas e frondosas árvores. Onde foram parar? Era tudo muito belo e admirável. Passados os anos, vejo como a estupidez e crueza estética de gestores públicos podem nos acometer de uma feiura urbana que leva nossas belas paisagens e lembranças, enche nossos juízos de ficus (Ficus benjamina) e assolapa a brisa das belas praças com caixinhas de cimentos onde serão fabricados viciados nas novas drogas auditivas da modernidade. Mesmo os banquinhos de pedras espalhados nas pouquíssimas praças, com nomes das famílias que formaram nossa Cidade, esculpidos à mão, foram substituídos por rolos de concreto nesse terrível processo de enfeiuramento da nossa Cidade.
Hoje no lugar da praça craveja de quarto rosa e verde, que recepcionou, no período pós chegada da energia elétrica, a magia da Tv, compartilhada publicamente, temos um sufocante aglomerado de quadradinhos de concreto, praça dos bares, que estimulam o consumo de álcool e outras drogas entre nossos jovens, única opção para essas vítimas vazias da ociosidade. Ali, quem não se lembra das frondosas árvores? E mesmo as fileiras das exóticas algarobas, árvore originária dos Andes no Peru e introduzida no Brasil em 1942, eram mais simpáticas que as novas árvores de plásticos embolotadas que sufocam de um verde chato nossa Cidade e nossas mentes. Esta espécie é originária da Índia e são inadequadas para arborização de praças e calçadas, mas crescem rápido e, por sermos a geração de apressados, preferimos “comer cru”. Na África e muitas partes do mundo os mais velhos plantam árvores para que seus filhos e netos descansem nas suas sombras.


Juracy Marques (homenagem ao aniversário de Jaguarary)
Antes é preciso que digamos que “praça” é um lugar de beleza onde se pode ter o prazer de se estar: homens, mulheres, passarinhos e borboletas. O espaço público onde está situada a Fontana di Trevi em Roma, conjunto de belas esculturas, construídas em um grande bloco de mármore branco, tendo como figura central a estátua do deus Netuno, é um exemplo do que poderíamos chamar de praça. Às nossas praças faltam beleza, arte, árvores!

Não precisa ser arquiteto ou mesmo engenheiro para perceber que Jaguarary “cresce” com um desordenado ordenamento urbano e paisagístico. É louvável a ação de alguns biólogos e ecologistas em levar beleza para os pedacinhos de espaços públicos que restam nas apertadas ruas e avenidas, hoje, cobertos com algumas gramíneas, algumas palmeiras, cactáceas e outras espécies de plantas. Aquela cidade dantes verdes, gradativamente, vem perdendo suas árvores. Mesmo as amendoeiras (Terminalia catappa L.), também conhecidas como “castanholas” em virtude de sua semelhança com um instrumento tradicional espanhol, da qual alimentava-me dos carnudos e doces frutos, gradativamente, estão desparecendo de nosso mapa. São árvores originárias da Índia e Nova Guiné que forma introduzidas no Brasil já no século XX. Lembro-me de que a nossa feira-livre acontecia num cercado de amendoeiras que estendia-se num caminho que levava a minha querida Escola Luiz Viana Filho. Quantos chinelos deixei em suas copas, pois tinha o hábito de derrubar os frutos usando meus surrados calçados como bumerangue. Às vezes eles não voltavam...

Ao acordar aos sábados pela canção do trem que passava em frente à minha casa na Rua da Estação, ávido pelo mugunzá de D. Almira, pelo caldo de cana da barraca do Pai do Nenzinho, pelo sorvete do Mario Tintino, ou mesmo pela pipoca e quebra-queixo do Seo Zé Dari, a alma negra que enfeitiçava toda a cidade com seu sorriso, serenidade e alquimia gastronômica, cortava o beco da venda de D. Carmosa ou mesmo a rua ao lado da Prefeitura para chegar à feira-livre. Sempre observava as árvores. Esta última rua fecharam e fizeram um passeio público onde observamos varais de bougainville (Bougainvillea glabra), nossa cabrita do Sertão. Sinto como se estivéssemos estreitando ainda mais a Cidade.

O trem passava e deixava saudades. Olho e vejo a Estação que deve ser o centro de memória da Jaguarary. Mas todas as vezes que reencontro esta paisagem, pergunto-me: de que são feitos os trilhos do trem além do ferro? Na frente da minha casa sempre via grandes amontoados de mourões. Eram muitas árvores mortas empilhadas, pintadas com pinche para não serem comidas pelos cupins e nem apodrecerem rápido demais. Quais árvores têm troncos tão grossos, de onde foram tiradas? São quantos quilômetros de árvores que sustentam ainda hoje a ferrovia? Sei, são os espíritos das árvores que adormecem sob o ferro feroz do desenvolvimento. Também por isso a Caatinga está mais nua.
Se vemos este escândalo nas áreas centrais, imagem nas periferias da Cidade. Tudo é apenas espaço para colocar casas. Não há planejamento para espaços públicos de lazer, nem tão pouco, de infraestrutura de serviços. Nossas periferias são lugares abandonados. Quando criança via a façanha do nascimento do Bairro Papelão, hoje, Odilon Gonçalves. Vi um bairro nascendo e crescendo como gente. O sonho de se ter um teto levou várias pessoas a fazer casas como os passarinhos. Tudo que era graveto servia para abrigar os pobres e os pequenos. Uma fatalidade: casas de papel, zinco, palha, cimento, substituíram mais um espaço verde da Cidade. Não restou quase nenhuma árvore daqueles tempos. Hoje, mais bem estruturado, vemos o papelão de não termos um Bairro arborizado. O mesmo aconteceu com a Fazenda da Ozana. No coração da Cidade, era uma área nobre, com árvores das primeiras memórias dessas terras. Eram espécies gigantescas que davam abrigo aos passarinhos afugentados dos outros bosques destruídos. Não me canso de lembrar das vezes em que tentei apanhar passarinhos, preás, coelhos nessas “matas virgens” de Jaguarary. Tudo se acabou. Resta no lugar um amontoado de paredes, muros e telhados, frente e verso. Enquanto os violinos tocam. queimam-se os bosques.
Como falei antes, tomo minha cidade por minha memória infantil. Assim, nas minhas lembranças a Rua da Lagoa e a Rua do Açude eram lugares bucólicos, rurais. Era uma selva pela qual se passava para ir para a Aroeira ou mesmo para lavar roupas na fonte. Antes da roça do Cícero, nosso encantador de cavalos, haviam casas que sempre pensei serem fazendas. Eram tantas árvores no caminho que nem sei contar. Nos arredores da Casa de Farinha que fica no pé da pedreira onde estão cravados os pés de Cristo quando andou na Terra, haviam muitas árvores frondosas. Estes dias, encontrei com os solitários mulungus (Erythrina velutina Willd), da família Leguminosae. Estão perdidos em terrenos privados e, pressinto, brevemente, serão abatidos. Trata-se de um árvore nativa da Caatinga, de porte médio, que pode atingir mais de 10 m de altura. Tem flores vermelhas grandes e suas sementes são joias naturais, muito usadas no artesanato tradicional dos indígenas e de outros grupos humanos.
Vivemos com as árvores sempre quietas e observadoras. Elas estão ao nosso lado enchendo nossos olhares de beleza e contando a nossa história. Carlos Drummond de Andrade, poeta brasileiro, dizia que “tentamos proteger a árvore esquecidos de que ela é que nos protege”. Quem não lembra das serras que abraçam Jaguarary coberta de um verde intenso ou mesmo das chamas que, do alto, lembravam aos simples moradores dessa bela região do Sertão que um raio caiu do céu ou mesmo, alguém descuidado, esqueceu de apagar a bituca do cigarro que deixara cair sobre os gravetos secos dessas matas nobres.
Quando tive na Espanha, fui visitar um bosque com um querido amigo ambientalista Boada Jucá. Impressionou-me o respeito que ele devota às árvores. Ele levou-me para Barcelona onde ministraria uma palestra sobre a “história social das árvores no mundo”. Fiquei tão encantado com o que ouvia em catalão, digo, sentia numa língua que pouco compreendia, que, por diversas vezes, emudecido, escorreram lágrimas de meus olhos. Ali entendi o precioso valor das árvores. Ele nos lembra que as sombras das árvores foram os primeiros templos humanos, que elas nos fornece alimento, energia, que ela é um corpo sagrado onde moram os deuses e almas dos espíritos. São lugares sagrados, santos. No brejo, onde minha Mãe e meu Pai plantavam verduras para vender nas feiras, hoje sei, um projeto de agricultura orgânica, agroecológico, havia uma árvore imensa que tinha um oco no seu tronco. No meu imaginário ali era um lugar sagrado onde o Saci Pererê morava. Sabia, pelas histórias de Monteiro Lobato, que o Saci protegia as florestas, mas só agora, entendo, tratar-se de um orixá africano, Ossain, que sabe o segredo das matas e guarda as florestas, filho de Nanã Borocô, a vovó de todos os orixás; irmão de Omolu e Oxum Maré.
Quantas vezes, nas manhãs, nas madrugadas, ao sair de casa para vender pão, para proteger-me da garoa, das chuvas, e mesmo para descansar do sol nas tardes, tive como abrigo a sombra generosa das poucas árvores que avistava nas ruas da minha Cidade, naquele momento, gigante. Eram caminhos cumpridos para uma criança mas, sabia, nossa sobrevivência dependia dos pães que vendia. Às vezes, em dias de folga, passava nas casas e gritava: “olha ê o pão”. Alguns clientes saiam correndo para ver se achava o menino do pão. Eu estava escondido, rindo.
Não me canso das vezes em que brincava com as os botões das flores “mijo de macaco”. Esta árvore fica próximo ao Jardim do Índio, onde tem uma bela escultura que lembra nosso esquecimento. Um índio de cimento, imponente, esculpido pelas hábeis mãos do escultor juazeirense Jota Mildes. É uma espécie originária da África conhecida como Tulipa-africana (Spathodea campanulata). Em alguns lugares é chama de mijo-de-macaco, bisnagueira, espatótia, chama-da-floresta, entre outras. Ela é da família das bignoniáceas. Poucas pessoas sabem, mas esta espécie exótica mata abelhas e beija-flores que buscam seu néctar e encontram-se com seus alcalóides tóxicos, responsável pela intoxicação desses bichinhos. Outra espécie de origem asiática, da família das Meliaceae, a mesma do mogno, que tem sido usada na arborização no Sertão é o nim (Azadirachta indica A. Juss), também tóxica e que tem matado várias espécies da nossa Caatinga em virtude do seu poder fungicida, germicida, inseticida. Por esse motivo, estamos chamando-a de “árvore baigon”. Consideramos a cidade como parte dos ecossistemas, portanto, também casa das borboletas, dos passarinhos, das formigas, das abelhas e não somente dos humanos. Assim, não podemos admitir que nossos gestores públicos façam arborização com plantas exóticas e matem nossos irmãos que, ou moram conosco, ou nos visitam todos os dias.

Recentemente, vi algo que me deixou muito feliz. Meus irmãos Robson, Clécio, Daiane e Glécia plantando na cidade árvores nativas da Caatinga. Elas estão crescendo e breve veremos ipês, caraibeiras, licurizieros florando em Jaguarary. As flores das árvores são mãos sagradas de grandes espíritos evoluídos.
Apesar de tão grande, sempre corria as quatro freguesias da Cidade. Ao deparar-me com o dinausáurico pé de cajazeira (Spondias mombin L), da família das Anarcadiaceae, espécie da Mata Atlântica, na frente da Casa do Bepe e da Valdira, ficava de água na boca. Não sabia que elemento provoca esse efeito, mas quando penso na árvore e seus frutos azedinhos, o cajá, fico com a “boca cheia d’água”, ainda hoje. Logo, estava nas mediações da Rua de Engenho. Adentrando serras acima, chegamos num bosque exuberante, com uma cobertura florestal belíssima. São uma infinidade de árvores que formam a pele desse finalzinho da Chapada Diamantina em Jaguarary. Lá para cima, sei, tem engenho, cachoeiras, riachos e muitas árvores frutíferas. É como a Serra dos Morgados que, quando criança, imaginava ser a “Amazônia” de tão grande que eram as árvores desse lugar, hoje já bastante desmatada. Para mim lá tudo era gigante, os macacos, as cobras, os passarinhos, as jaqueiras, os cafezais, as mangueiras, e, mesmo, o Povoado, ficava nos rincões da floresta. Era longe, muito longe. Um lugar quase impossível de chegar. Mas na minha imaginação sempre perguntava-me o que é “morgado”, o que é “catuabo”, nome dos povoados que estavam no caminho da roça dos meus avós maternos (Mãe Lice e Pai Manele).
Cresci e descobri seus sentidos: sobre “morgado” refere-se ao herdeiro primogênito e o “catuabo” é nome de uma bela árvore medicinal, de nome científico Eriotheca candolleana, da família das Bombacaceae. Certamente, nesse lugar, haviam muitos pés de Catuaba. Sobre o Povoado, considerando o modo de falar bem particular dessa comunidade, minha hipótese é de que tenha sido um acampamento de ciganos no passado. Meus bisavôs (Vivina e Oiô) são de lá e têm descendência room ou calon, povos nômades.
Minha paixão pelo café começa na Serra dos Morgados. Meu Avô cultivava esta espécie (Coffea arabica L), da família das Rubiaceae, que veio da Etiópia, antigamente Abissínia. Chamamos o café de “néctar da Abissínia”, minha bebida predileta. Quando estiver morrendo, desejo, alguém faça um café. É o cheiro mais extraordinário que tocou minha alma. Minha mãe torrava os grãos em grandes tachos com açúcar e tão logo fosse atingido o ponto de uma densa calda negra, a escorria sobre uma superfície untada com cinza, pó da alma das árvores. Formava-se uma espécie de cocada de café. Quando seca obtinha-se o pó macerando-o no pilão feito com um tronco de madeira nobre, lapidado por hábeis artesãos. Os pilões são peças valorosas na nossa cultura. Era um café forte, animador.
Jaguarary é uma cidade cujos povoados são denominados com muitos nomes de espécies de árvores, como é o caso de Gameleira (Ficus adhatodifolia), Pau Ferro (Caesalpinia férrea), Aroeira (Myracrodruon urundeuva), Umburana (Commiphora leptophloeos), Angico (Anadenanthera colubrina), Favela (Cuidosculus phyllancanthus), Caraíba (Tabebuia caraiba), entre outros.
Sobre a Caraíba: nome associado a uma árvore que ocorre na caatinga, popularmente conhecida como caraibeira, da família das Bignoniaceae, bela árvore de médio e grande porte com intensa floração amarelada. Parte da riqueza do município advém da exploração do cobre em Caraíba, ouro das terras secas.
Nas bandas das areias, temos uma biodiversidade singular onde observamos muitos pés de jurema (Mimosa tenuiflora), ouricuriziero (Syagrus coronata), madacaru (Cereus giganteus), facheiro (Pilosocereus pentaedrophorus), xique-xique (Pilosocereus gounellei), guabiraba (Campomansia sp), umbuziero (Spondias tuberosa), juazeiro (Ziziphus joazeiro), umburana, e tantas outras belas árvores do Bioma Caatinga. A história de cada uma delas renderia um romance. Quem não sabe do sabor exótico dos frutos da guobiraba, do umbuzeiro e do licurizeiro? Do valor medicinal do juá? Do valor sagrado da jurema? Dos usos para alimentar a criação do mandacaru, do facheiro, das cabeças-de-frade (Melocactus zehntner)? Destaco delas o pé de umburana-de-cheiro (Amburana cearensis), da família das leguminosae. Sabendo do valor medicinal de suas sementes, todas as vezes que ia para casa de D. Nazinha, descansar naquela paisagem bucólica ao lado de uma das mulheres mais lindas da nossa história, ficava admiriando a beleza daquela árvore que tinha na frente de sua casa. Trata-se de um pé de pau aromático e imponenente que pode atingir até 25 metros de altura, de floração branco-amarelada, pequenas e muito perfumadas. Um luxo das caatingas! Quem já recebeu uma carta de amor perfumada com a semente de umburana-de-cheiro?
Ah! Tantas histórias com nossas plantas! Na Semana Santa, toda a cidade colhia no monte as « bengalas » que são espécies de cipós ameaçados de extinção. Quantos galhos torados nos « domingos de ramo », quantas folhas sagradas nas orações das nossas rezadeiras, quantos abrigos sustentados por varas (jovens árvores) e barro, quantos tetos cobertos com palhas, quantos corpos aquecidos com esteiras…
Mas as nossas matas queimam para nos dar o pão. Desde pequeno ficava pensando, em casa, que era uma padaria, como as florestas faziam para crescer e a gente ficar tirando dela a lenha. Cada feixe de lenha, pensava, eram muitas árvores mortas. Toda nossa gente ainda usa a lenha como fonte de energia. Os folgões à lenha são belos mas também perigosos. A foligem e a fumaça nas cozinhas tradicionais são responsáveis por muitas mortes no Sertão. Este é um problema que temos que encarar com uma certa urgência. Hoje vejo grandes fornos industrias e, imagino, que milhares de árvores estão ardendo nas caldeiras sem que se tenham plantado novas. Breve, e já é visível, toda a nossa cobertura vegetal estará perdida para sempre se não fizermos algo.
Tive o privilégio de ter tido a família que tenho e ter pais agricultores, gente da roça. Mesmo cansados, nas noites estreladas, tínhamos o hábito de colocar lona no terreiro e ficar olhando o céu, contando as estrelas, observando a lua. Estas cenas traduzem minha paixão pelas teorias da origem do universo. Estes dias, em programa da Dsicoveri sobre a origem do mundo, fiquei conhecendo sobre a Teoria Brana a partir da qual se pensa que duas dimensões paralelas se chocaram e, liberando quantidade de energia e matéria, deram origem aos universos. Assim o big bang não seria pensado mais como a origem a partir do nada. A Teoria Brana que se soma a Teoria das Cordas e à Teoria M, nos faz pensar que outros universos existem além desse universo, e que esses choques das branas são infinitos. Paul e Neil são físicos teóricos que sustentam essas teses. Assim, pensam, há tempos antes do tempo. A frase “do tempo ao tempo” nos sugere um encontro, pela espiritualidade, dessas teorias. Essa curiosidade sobre a origem das estrelas, do universo, da Terra, das pessoas e das árvores se mantém em mim e, em alguma medida, alimentam o pesquisador que me tornei.
Meus olhos de criança passaram anos vendo a árvore mais linda do mundo no meu jardim. Era como o pé de baobá do Pequeno Príncipe do Exupery. Quantos outros olhares, quantas histórias ela também não viu. Estes dias, já adulto, volto à nossa Cidade e vi a árvore mais linda do Planeta morta. A cena trouxe-me lágrimas aos olhos. Nosso Monge Verde, o Velho Tambori, tinha sido vencido. É como se tivesse perdido um irmão.
Tamburi. Quem, nesses dois últimos séculos, que por aqui viveu, não guarda em sua memória a imagem da árvore mais solitária de Jaguarary? Ela era um totem da Cidade. Assistiu, paciente, a todas as cenas e, como tudo que há abaixo do céu, este ano, deixou-nos sem que tivéssemos tempo de nos despedirmos. Para mim era um “monge” que vivia meditando. Um Velho sábio que ensinava-me as lições mais nobre sobre a natureza, seus segredos. Era a árvore mais bonita que vi em toda a minha vida. Despeço-me do meu Velho Amigo Tambori. Quantas vezes serviu-me de descanso. Quando viajava para Senhor do Bonfim, meus olhos o contemplava pelas frestas das janelas dos carros que, milhares de vezes, o cruzaram. Em dias de chuva, quando não podia vê-lo, crescia em meu peito a saudade do velho e saudoso Amigo.
Só o solitário Jenipapo (Genipa americana), que sombreava o córrego das águas do Bendó, aproximava do estado de isolamento e meditação do Velho Tambori. Nem mesmo a imagem das velhas barrigudas (Ceiba speciosa) que via nas minhas caminhadas para o Brejo, estão saudosamente fixas na minha alma como este Ancião que perdemos. É igualmente bela a imagem das barrigudas floridas, a se cobrir de flores brancas quando desnudas de suas folhas, nos outono das noivas.
Também conhecido como “orelha de macaco” e “orelha de negro”, em virtude de seus frutos que amadurecem geralmente nos meses de julho a agosto, o TAMBURI é chamado cientificamente de Enterobium timbouva. Trata-se de uma árvore que pode atingir até 20 metros de altura dotada de copa ampla e frondosa. Saudoso do meu Velho Amigo, lembro-me da poesia do Velho Bilac “Velhas Árvores”:
Olhas estas velhas árvores, - mais belas,
Do que as árvores mais moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...

O homem, a fera e o inseto à sombra delas
Vivem livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E alegria das aves tagarelas...
Não choremos jamais a mocidade!
Envelheçamos rindo! Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,

Na glória da alegria e da bondade
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!

Hoje, do meu Velho Amigo Tamburi sinto saudades. Saudade sei, é uma palavra grande, que só tem um lugar que cabe, não mora dentro do peito, mas na imensidão da minha alma.

Referência Bibliográfica:
MATOS, Eloina. Árvores para Cidades. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia:Solisluna, 2009.

Texto enviado por Juracy Marques , em homenagem ao aniversário de Jaguarari

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